domingo, 25 de março de 2012

CIF (Classificação Internacional de Funcionalidade)




1.Introdução:

Será abordado através deste os conceitos:histórico,objetivos, e aplicações da Classificação Internacional de Funcionabilidade (CIF). Visando esclarecer e orientar futuros profissionais da área para a importância de uma classificação que organize de forma significativa as limitações de atividades de um paciente e os fatores ambientais que podem atuar como facilitadores ou barreiras para o desempenho dessas atividades.

2.Conceito

A CIF introduz uma mudança radical de paradigma, do modelo puramente médico para um modelo biopsicossocial e integrado da funcionalidade e incapacidade humana. Sintetiza, assim, o modelo médico e o modelo social numa visão coerente das diferentes perspectivas de saúde: biológica, individual e social, (CIF-OMS, 2001).

A CIF descreve a funcionalidade e a incapacidade relacionadas às condições de saúde, identificando o que uma pessoa “pode ou não pode fazer na sua vida diária”, tendo em vista as funções dos órgãos ou sistemas e estruturas do corpo, assim como as limitações de atividades e da participação social no meio ambiente onde a pessoa vive O termo do modelo da CIF é a funcionalidade, que cobre os componentes de funções e estruturas do corpo, atividade e participação social. A funcionalidade é usada no aspecto positivo e o aspecto negativo corresponde à incapacidade. Segundo esse modelo, a incapacidade é resultante da interação entre a disfunção apresentada pelo indivíduo (seja orgânica e/ou da estrutura do corpo), a limitação de suas atividades e a restrição na participação social, e dos fatores ambientais que podem atuar como facilitadores ou barreiras para o desempenho dessas atividades e da participação. A CIF fornece uma descrição de situações relacionadas às funções humanas e a suas restrições, servindo como uma estrutura para organizar essas informações de forma significativa, integrada e facilmente acessível.

3.Histórico

Visando responder às necessidades de se conhecer mais sobre as consequências das doenças, em 1976 a OMS publicou a International Classification of Impairment, Disabilities and Handicaps (ICIDH), em caráter experimental. Esta foi traduzida para o Português como Classificação Internacional das Deficiências, Incapacidades e Desvantagens (handicaps), a CIDID.

De acordo com esse marco conceitual, impairment (deficiência) é descrita como as anormalidades nos órgãos e sistemas e nas estruturas do corpo; disability (incapacidade) é caracterizada como as consequências da deficiência do ponto de vista do rendimento funcional, ou seja, no desempenho das atividades; handicap (desvantagem) reflete a adaptação do indivíduo ao meio ambiente resultante da deficiência e incapacidade.

O processo de revisão da ICIDH apontou suas principais fragilidades, como a falta de relação entre as dimensões que a compõe, a não abordagem de aspectos sociais e ambientais, entre outras. Após várias versões e numerosos testes, em maio de 2001 a Assembleia Mundial da Saúde aprovou a International Classification of Functioning, Disability and Health (ICF). A versão em língua portuguesa foi traduzida pelo Centro Colaborador da Organização Mundial da Saúde para a Família de Classificações Internacionais em Língua Portuguesa com o título de Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde, CIF.

4.Objetivos

O objetivo geral da classificação é proporcionar uma linguagem unificada e padronizada assim como uma estrutura de trabalho para a descrição da saúde e de estados relacionados, permitindo a comparação de dados referentes a essas condições entre países, serviços, setores de atenção à saúde, bem como o acompanhamento da sua evolução no tempo.

A classificação define os componentes da saúde e alguns componentes do bem-estar relacionados com a saúde (tais como educação e trabalho). Os domínios contidos na CIF podem, portanto, ser considerados como domínios da saúde e domínios relacionados com a saúde. Estes domínios são descritos com base na perspectiva do corpo, do indivíduo e da sociedade em duas listas básicas: (1) Funções e Estruturas do Corpo, e (2) Atividades.

No entanto, os conceitos apresentados na classificação introduzem um novo paradigma para pensar e trabalhar a deficiência e a incapacidade: elas não são apenas uma consequência das condições de saúde/doença, mas são determinadas também pelo contexto do meio ambiente físico e social, pelas diferentes percepções culturais e atitudes em relação à deficiência, pela disponibilidade de serviços e de legislação. Dessa forma, a classificação não constitui apenas um instrumento para medir o estado funcional dos indivíduos.

Além disso, ela permite avaliar as condições de vida e fornecer subsídios para políticas de inclusão social.

5.Os usos da CIF

A CIF tem sido apontada como uma espécie de “canivete suíço”: contém uma série de ferramentas e permite várias abordagens. Ela pode ser usada em muitos setores que incluem a saúde, educação, previdência social, medicina do trabalho, estatísticas, políticas públicas. Sua importância pode ser colocada

para as práticas clínicas, ensino e pesquisa. Na área clínica, ela se propõe a servir de modelo de atendimento multidisciplinar, devendo servir para as várias equipes e os vários recursos de que dispõem os serviços, tais como médico, psicólogo, terapeuta, assistente social etc.

Uma das vantagens apontadas para a adoção do modelo é a possibilidade de uniformização de conceitos e, portanto, da utilização de uma linguagem padrão que permita a comunicação entre pesquisadores, gestores, profissionais de saúde, organizações da sociedade civil e usuários em geral.

Um dos campos de estudo mais explorados para a aplicação da CIF tem sido a área de Medicina Física e Reabilitação, no que concerne ao acompanhamento do estado de saúde dos pacientes em tratamento. O uso da CIF tem sido considerado também na avaliação após transtornos agudos, condições traumáticas, condições crônicas e na geriatria

6.Aplicações

Desde a sua publicação como versão experimental, em 1980, a ICIDH tem sido

utilizada para vários fins, por exemplo: como uma ferramenta estatística – na colheita e registro de dados (e.g. em estudos da população e inquéritos na população ou em sistemas de informação para a gestão); como uma ferramenta na investigação – para medir resultados, a qualidade de vida ou os fatores ambientais; como uma ferramenta clínica – avaliar necessidades, compatibilizar os tratamentos com as condições específicas, avaliar as aptidões profissionais, a reabilitação e os resultados; como uma ferramenta de política social – no planejamento de sistemas de segurança social, de sistemas de compensação e nos projetos e no desenvolvimento de políticas; como uma ferramenta pedagógica – na elaboração de programas educacionais, para aumentar a conscientização e realizar ações sociais.


7.Conclusão:

Conclui-se assim que a CIF tem múltiplas finalidades: fornecer uma base científica para o entendimento e o estudo da saúde e estabelecer uma linguagem comum a ser utilizada pelos usuários e profissionais da saúde, além de influenciar e motivar a produção científica da área, promovendo o desenvolvimento de novas avaliações e condutas. O enfoque principal da CIF é a influência dos fatores contextuais (ambientais e pessoais) e seus impactos, tanto positivos quanto negativos, nas três dimensões das condições de saúde: estrutura e função do corpo, atividade e participação social. Nessa classificação, todos os domínios de saúde e os conteúdos relacionados interagem e apresentam a mesma relevância para descrever o processo de funcionalidade e incapacidade. Essa classificação constitui uma abordagem com múltiplas perspectivas para descrever a funcionalidade e a incapacidade como um processo interativo e evolutivo.


Referências:

1. FARIAS, N. BUCHALLA, M. C. A Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde da Organização Mundial da Saúde: Conceitos, Usos e Perspectivas. Rev Bras Epidemiol, p. 187-93, 2005.

2. Organização Mundial da Saúde, Direção-Geral da Saúde. CIF Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde. 2003

3. Instituto Nacional para a Reabilitação. CIF uma mudança de paradigma. Atualização 11 Agosto de 2010. Disponível em: <http://www.inr.pt/content/1/52/cif-uma-mudanca-paradigma> Acesso em: 22 de março de 2012.

domingo, 11 de março de 2012

Fundamentos psiconeurológicos da bateria psicomotora (BPM)



Para darmos inicio a esta discussão precisamos ressaltar antes de mais nada que o cérebro da criança é um órgão diferenciado do cérebro do adulto. Para tanto, fazer um exame neurológico numa criança implica especificidades e particularidades diferenciadas do processo examinatório de um cérebro já maturo, para que assim haja eficácia, exatidão e significância nos resultados.

Sabendo que o exame psicológico clássico não valoriza as funções psiconeurológicas que sustentam os processos verbais e não verbais, surge a grande dificuldade da interdisciplinaridade entre a psiconeurologia e a psicomotricidade aplicada à criança.

Desenvolver uma nova metodologia e abordar psiconeurológicamente a psicomotricidade é em si uma tarefa difícil e complexa.

A BPM (bateria psicomotora) apresenta-se como um dispositivo diferente das escalas de desenvolvimento motor, baseado num conjunto de tarefas que permitem detectar déficits funcionais em termos psicomotores. Dela retiramos dados sistemáticos de grande interesse para a identificação qualitativa de problemas psicomotores e de aprendizagem. ABPM é um instrumento de identificação de sinais e não um exame neurológico especifico, ele tem o intuito de captar a personalidade psicomotora da criança e ao mesmo tempo o grau de integridade dos sistemas funcionais complexos, segundo o modelo de organização cerebral apresentado por Luria.

Tal bateria busca analisar qualitativamente o sinais psicomotores, comparando-os com as funções do sistema básico do cérebro, subtraindo da sua aplicação clínica, conseqüentemente, significações funcionais que possam explicar o potencial da aprendizagem da criança observada, tentando atingir uma compreensão aproximada do modo como trabalha o cérebro e, simultaneamente, dos mecanismos que constituem a base dos processos mentais da psicomotricidade.

Para entender todo este processo é necessário estabelecer uma relação detalhada entre os fatores psicomotores e as unidades funcionais de Luria. A primeira unidade funcional compreende a tonicidade e o equilíbrio.

A tonicidade é aquela que exerce a função de alerta e vigilância que exige a mobilização de certa energia essencial à ativação dos sistemas seletivos de conexão, sem os quais nenhuma atividade mental pode ser processada, mantida ou organizada. A BPM é definida essencialmente na sua componente corporal, isto é, na tensão ativa em que se encontram os músculos, quando a inervação e a vascularização estão intactas, processando a ativação dos reflexos intra, inter e supra-segmentares que asseguram as acomodações adaptativas posturais. Trata-se da estrutura básica que prepara e guia a atividade osteomotora, controlando a modelação articular e garantindo o ajustamento plástico e integrativo da amplitude dos movimentos.

Na BPM a equilibração é uma função determinante na construção do movimento voluntário, condição indispensável de ajustamento postural e gravitacional, sem o qual nenhum movimento intencional pode ser atingido. De acordo com inúmeras investigações, o centro regulador da mente, o neocerebelo, coadjuvado pelo núcleo vestibular do tronco cerebral e igualmente por muitos outros núcleos mesencefálicos de integração motora postural e proprioceptiva.

A segunda unidade funcional compreende os seguintes fatores psicomotores da BPM: Lateralização, noção do corpo e estruturação espácio-temporal.

A lateralizaçãono modelo luriano respeita a progressiva especialização dos dois hemisférios como o resultado das funções sócio-históricas do trabalho e da linguagem, tendo adotado inclusive a designaqção de hemisfério “dominante” para o esquerdo e de “subdominante” para o direito. Na BPM a lateralização retrata a organização inter-hemisférica em termos de dominância: telerreceptora(ocular e auditiva), proprioceptora(manual e pedal) e evolutiva(inata e adquirida).

Na BPM, a noção de corpo(somatognosia) á noção pavloviana de analisador motor, onde são projetadassomatotopicamente as informações intracorporais, cujo substrato neuroatomico compreende os lóbulos parietais.

A estruturação espacial na BPM envolve funções de recepção, processamento e armazenamento espacial, que requerem uma estruturação perceptivo-visual, que envolve as áreas visuais do córtex occipital.

A terceira unidade funcional integra os dois últimos fatores psicomotores da BPM: praxia global e praxia final.

A praxia global no modelo de luria compreende, como o próprio nome sugere, as áreas pré-motoras, visto compreender tarefas motoras motoras sequenciais globais, onde está em causa a participação de grandes grupos musculares. A praxia fina, por constar de tarefas de dissociação digital e de preensão construtiva com significativas participações de movimentos dos olhos e da coordenação oculomanual e da fixação da atenção visual.

Apresentação, administração e cotação dos fatores psicomotores (BPM)

Muitos autores na área da neurologia e da educação tem insistentemente reforçado a importância das relações entre o desenvolvimento e a aprendizagem.

A integração psicomotora na criança ilustra e materializa consequentemente, a totalidade da sua aprendizagem.

A qualidade do perfil psicomotor da criança, reflete o grau de organização neurológica das três principais unidades, segundo Luria, está indubitavelmente assiciada ao seu potencial de aprendizagem, quer em termos de integridade, quer fundamentalmente em termos de dificuldade.

A BPM não é um teste no sentido tradicional, é uma bateria de observação que permite ao prático(educador, professor, psicólogo, terapeuta etc.) observar vários componentes do comportamento psicomotor da criança de uma forma estruturada e não estereotipada. Dá oportunidade para observar as desordens da atenção, as aquisições de processamento da informação visual e auditiva, a competência linguística, a orientação espacial e temporal, a estrutura cognitiva da criança, o comportamento emocional etc. Apresenta condições e oportunidades para estudar a psicomotricidade atípica, podendo no seu todo ou em alguns fatores ser utilizada para estudar a psicomotricidade em deficientes visuais, da comunicação, sócio-emocionais, etc.

O resultado total da BPM é obtido nos quatro parâmetros já apresentados todos os subfatores, sendo a cotação média de cada fator arredondada. A cotação assim obtida traduz de forma global cada fator, cotação essa que será transferida para a primeira página onde se encontra o respectivo perfil psicomotor. A cotação máxima da prova é de 28 pontos (4x7 fatores), a mínima é de 7 pontos (1x7) e a média é de 14 pontos.

Os perfil psicomotor superior e bom (perfil hiperpraxico) são obtidos por crianças que não apresentam dificuldades de aprendizagem especifica e, por isso, apresentam uma organização psiconeurologica normal. O perfil psicomotor normal (perfil eupraxico) é obtido por crianças sem dificuldades de aprendizagem, podendo, no entanto, apresentar fatores psicomotores já mais variados e diferenciados. O nível de realização é completo, adequado e controlado na maioria dos fatores, podendo surgir um ou outro subfator que revela imaturidade ou imprecisão de controle.

O perfil psicomotor dispraxico identifica a criança com dificuldade de aprendizagem ligeiras, traduzindo já a presença de um ou mais sinais desviantes, que assumem significação neuroevolutivas, consoante à idade e a severidade do sintoma que apresenta a criança. O perfil psicomotor deficitário(perfil apraxico) é obtido por crianças com dificuldade de aprendizagem significativas do tipo moderado ou severo.

A obtenção dos perfis permite ao observador considerações pertinentes e relevantes, não só quanto a sua relação com as três unidadesfuncionais de Luria, objetivando e isolando os sinais de forma mais coerente, como também ao encaminhamento a dar ao caso e quanto às estratégias reabilitativas a implementar.

Os aspectos tipológicos com base nos três fascículos do embrião: o fascículo externo ou ectoderme, que formara os músculos, os ossos, o miocárdio, artérias, veias, órgãos genitais, rins, etc.; e por último fascículo interno ou endoderme, que formará o tubo digestivo, o epitélio respiratório, a bexiga, a tiroide, o timo etc. Classificou os indivíduos em três componentes, e são esses que devem ser assinalados na ficha de registro. O ectomorfismo, caracterizado pela linearidade e magreza corporal, com tronco reduzido e membros compridos; o mesomorfismo, caracterizado pela estrutura muscular e atlética do corpo, e o endomorfismo, essencialmente caracterizado pelo aspecto arredondado e amolecido do corpo, geralmente gordos com o tronco extenso e os membros curtos.

Os fatores e subfatores da observação direta mais sistemática vão-se seguir de acordo com a lógica da hierarquia dos fatores psicomotores e de acordo também com a organização vertical ascendente das três unidades funcionais do modelo psiconeurológico de Luria. Começaremos pelo fator da tonicidade e respectivos subfatores.

Tonicidade

Integrado na primeira unidade funcional do cérebro, cuja função primordial de alerta e de vigilância assegura as condições genéticas e seletivas, sem as quais nenhuma atividade mental pode ser realizada.

A tonicidade garante, por consequência, as atitudes, as posturas, as minicas, as emoções, etc., de onde emergem todas as atividades motoras humanas. Tem um papel fundamental no desenvolvimento motor e igualmente no desenvolvimento psicológico.

Toda a motricidade necessita do suporte da tonicidade, isto é, de um estado de tensão ativa e permanente, por isso, a organização muscular humana está estruturada em três camadas: a da superfície, a intermediaria e a da profundidade. A da superfície, destinada a função motora, altamente energética, é basicamente composta de músculos poliarticulares; a da profundidade, destinada a função tonica, de fraca mobilização energética e fundamentalmente composta de músculos monoarticulares.

De fato, é impossível separar a motricidade da tonicidade, como não é possível separar a postura e a atitude do movimento voluntário. Toda motricidade parte de uma tonicidade que as segue como uma sombra, preparando-a, apoiando-a e inibindo-a, isto é, auto-regulando-a.

Sugere-se o estudo do tônus de suporte com base na extensibilidade e na passividade, condições tais que permitem definir a propensão à hipotonia ou hipertonia, cuja significação psiconeurologica é, efetivamente, de grande importância.

A criança hipotônica é mais extensiva, calma em termos de atividades, o seu desenvolvimento postural é normalmente mais lento que os das crianças hipertônicas, a sua predisposição motora centra-se mais frequentemente no preensão e nas praxias finas e, consequentemente, as suas atividades mentais surgem mais elaboradas, reflexivas e controladas.

A criança hipertônica é menos extensível, ativa, com um desenvolvimento postural mais precoce, daí a sua predisposição para a marcha e para a exploração do espaço envolvente, consequentemente, as suas atividades mentais surgem mais impulsivas, dinâmicas e, por esse fato também, mais descoordenadas e inadequadas.

No caso extremo da hipertonia e da hipoextensibilidade, temos as crianças espásticas com paralisia cerebral. Nesse caso, a espasticidade a inflexibilidade e a rigidez são típicas, a função do anel gama não é superiormente inibida, os reflexos de estiramento são exagerados e a modulação e a plasticidade tonica deixam de operar, daí a concentração de resistência que os músculos oferecem aos movimentos passivos.

O fator da tonicidade na BPM compreende o estudo do tônus de suporte e do tônus de ação. O tônus de suporte compreende os subfatores da extensibilidade, da passividade e da parotonia. O tônus de ação compreende os subfatores das diadococinesias e das sincinesias.

Descrição dos subfatores e cotação

Extensibilidade

A extensibilidade é definida como o maior comprimento possível que podemos imprimir a um musculo afastando as suas inserções.

Para se avaliar consequentemente a extensibilidade, é necessário ter em conta que a resistência ao alongamento, isto é, ao afastamento de dois segmentos ósseos unidos pela mesma articulação, é maior nos músculos flexores do que nos extensores.

Na BPM, explora-se a extensibilidade nos membros inferiores e nos membros superiores, desde as articulações proximais as cistais, passando pelas intermédias, abrangendo a exploração da musculatura proximal e distal. Nos membros inferiores mais relacionados com o desenvolvimento postural explora-se a extensibilidade dos seguintes músculos: adutores, extensores da coxa e quadricipete femural. Nos membros superiores, mais relacionados com o desenvolvimento da preensão, explora-se a extensibilidade dos seguintes músculos: deltróides anteriores e peitorais, flexores do antebraço e extensores do punho.

Passividade

A passividade é definida como a capacidade de relaxamento passivo dos membros e suas extremidades distais perante mobilização, oscilações e balanços ativos e bruscos introduzidos exteriormente pelo observador.

Na exploração dos membros inferiores, o procedimento requer que a criança seja sentada como numa cadeira ou mesa, suficientemente alta para que os pés fiquem suspensos, fora do contato com o solo. Devem-se mobilizar as pernas com apoio no terço inferior da perna, de forma que a articulação do pé fique livre. As mobilizações deverão ser efetuadas no sentido antero-posterior, apreciando-se, ao mesmo tempo, a oscilação pendular das pernas.

Na exploração dos membros superiores, deverá proceder-se da seguinte forma: a criança deve manter-se de pé, com os braços pendentes e descontraídos, ao mesmo tempo que o observador introduz deslocamentos anteriores, balanços e oscilações em ambos os braços e mãos, por mobilização ântero-posterior do terço inferior do antebraço, isto é, ligeiramente acima da articulação do punho.

Paratonia

Traduz a incapacidade ou a impossibilidade de descontração voluntária. É um estado patológico, revelado pelo exagero dos reflexos tendinosos.

A paratonia revela a existência, ou não, de liberdades motoras em nível articular e a presença, ou não,d e uma organização tônico motora de base; atua como frenagem tônica, impedindo o relaxamento muscular, exatamente porque certas tensões e contrações se conservam à volta das articulações distais e proximais, desenvolvendo sinergias onerosas que prejudicam a realização do movimento.

As paratonias são observadas, quer nos membros superiores, quer nos membros inferiores, através de mobilização passiva e de quedas. A observação das paratonias está naturalmente associada à observação da tonicidade de repouso, bem como à lateralização, visto que os membros dominantes acusam menos extensibilidade e, por consequência, tendem a apresentar maior resistência nas manobras e nas manipulações.

Diadococinesias

Compreendem a função motora que permite a realização de movimentos vivos, simultâneos e alternados.

Trata-se de uma realização coordenada,sucessiva e antagônica de movimentos com ambas as mãos, que pôe em jogo a coordenação cerebelosa

Sincinesias

Traduzem reações parasitas de imitação dos movimentos contralaterais e de movimentos peribucais ou linguais.

Trata-se de movimentos não intencionais, desnecessários, cuja eliminação exige inibição tônico- sinética.

De alguma forma, traduzem movimentos associados que acompanham a realização no movimento intencional, prejudicando a sua precisão e eficácia.

Significação psiconeurológica

Os sinais captados com a observação do fator tonicidade são inúmeros e complexos, difíceis mesmo de objetivar ou estadardizar, exatamente porque cada sinal pode representar diferentes tipos de significação psiconeurológica.

A organização motora de base é o primeiro alicerce fundamental do sistema funcional complexo, que compreende a psicomotricidade, Sem a organização tônica e suporte, a atividade motora nçao se desencadeia, nem a estruturação psicomotora se desenvolve. A tonicidade requer não sóuma hipercomplexa organização de padrões reflexos a todo nível do neuroeix, como subentende toda a integração sensorial subcortical e cortical.

Imobilidade

É definida como a capacidade de inibir voluntariamente todo e qualquer movimento durante um curto lapso de tempo.

Através da sua observação, podemos avaliar a capacidade da criança em conservar o equilíbrio com os olhos fechados, os ajustamentos posturais, as reações tônico-emocionais, movimentos faciais,involuntários, gesticulações, sorrisos, oscilações multi e unidirecionais, distonias , movimentos coreiformes e atetotiformes.

Equilíbrio estático

O equilíbrio estático requer as mesmas capacidades da imobilidade e, no fundo, reveste-se exatamente das mesmas características e significações nela descritas.

Equilíbrio dinâmico

O equilíbrio dinâmico exige, ao contrário do estático uma orientação controlada do corpo em situações de deslocamento no espaço com os olhos abertos.

A observação deve captar sinais quanto à precisão,economia e melodia dos movimentos, quanto ao seu controle em termos quantitativos e qualitativos e quanto o grau de facilidade ou dificuldade relevado nas várias tarefas.

Significação psiconeurológica

A significação psiconeurológica do segundo fator psicomotor da BPM é, inegavelmente extremamente relevante, quer no domínio da motricidade, quer no âmbito de aprendizagem.

A equilibração, abrangendo o controle postural, revela o nível de integridade de importantes centros e circuitos neurológicos, sem os quais nenhuma atividade pode ser realizada.

De forma esquemática, a equilibração envolve vários centros de trabalho quer em nível inferior, intermédio e superior. Os níveis mais baixos, ou seja, os inferiores e intermédios, são exatamente aqueles que se tenta estudar com o fator equilibração, pois são eles que mantém a postura e a tonicidade, que no desenvolvimento da criança assumem as primeiras aquisições e mais tarde preparam e facilitam os processos de aprendizagem mais complexos.

Lateralização

A lateralização que constitui o terceiro fator da BPM está integrada na segunda unidade funcional de Luria cuja função fundamental compreender a recepção, a analise e o armazenamento da informação.

A lateralização como o resultado da integração bilateral postural do corpo é peculiar no ser humano e está implicitamente relacionada com a evolução e utilização dos instrumentos.

A lateralização basicamente inata é governada por fatores genéticos, embora a treinabilidade e os fatores de pressão social a possam influenciar.

A integração bilateral dos dois lados do corpo é uma condiçãobásica da motricidade humana decorrente dos dois fatores psicomotores anteriormente abordados.

A integração bilateral é indispensável ao controle postural e ao controle perceptivo-visual. Sem esses dois lados, a lateralização como sistema funcional complexo não se diferencia e, consequentemente , produz os seus efeitos na psicomotricidade e na aprendizagem.

Descrição dos subfatores e cotação

As tarefas da BPM visam fundamentalmente determinar a consistência da preferência dos telerreceptores e dos proprioefetores.

Noção do corpo

A noção do corpo que constitui o quarto fator da BPM, está também integrada na segunda unidade funcional de Luria, curaj função primordial é a recpção, analise e armazenamento da informação.

A noção do corpo em termos psicomotores encerra o conceito pavloviano de analisador motor, cujas projeções corticais se concentram no lóbulo parietal. As múltiplas informações proprioceptivas pré-selecionadas no tronco cerebral e nas estruturas talâmicas ascendem ao córtex para aí criarem uma conscientização específica do corpo, conscientização essa ontogenética e apreendida através da experiência motora e da mediação social.

A noção do corpo compreende uma representação mais ou menos consciente do nosso corpo, dinâmica e postural, posicional e espacial que encerra o revestimento cutâneo que nos põe em contato com o mundo exterior.

Sentido Cinestésico

A somestesia refere-se à sensibilidade cutânea e subcutânea, envolvendo, no caso da BPM a pesquisa da identificação tátil do corpo, enquanto o sentido cinestésico compreende o sentido posicional e o sentido do movimento fornecido pelos proprioceptores.

Imitação de gestos

As tarefas desse subfator resumem a capacidade de análise visual de posturas e gestos, desenhados no espaço, sua retenção visual de curto termo e respectiva transposição motora por meio de cópia gestual bilateral.

Através das tarefas desse subfator podemos avaliar a capacidade de recepção análise, retenção e reprodução de posturas e gestos envolvendo a noção do corpo, a sua diferenciada localização espacial, a coordenação oculomanual, a orientação espacial e finalmente, a qualidade e execução de movimentos.

Desenho do corpo

Na BPM, o desenho do corpo incluído no fator da noção do corpo é um mieo de avaliação da representação do corpo vivido da criança, refletino o seu nível de integração somatognóstica e a sua experiência psicoafetica.

Em principio, acriança desenha o que sabe do seu corpo, como verdadeira síntese psicomotora, justapondo aspectos visuaotátil- quinestésicos transcritos sobre a forma gráfica.

Significação psiconeurológica

A noção do corpo é a imagem do corpo humano e humanizado, imagem adquirida, elaborada e aorganizada no cérebro do indivíduo por meio da sua aprendizagem mediada. A imagem do corpo não é a soma total das percepções e das experiências, mas a constelação dessas experi~encias num todo de si próprio.

Estruturação espácio-temporal

Na BPM envolve basicamente a integração cortical de dados espaciais, mais referenciados com o sistema visual e de dados temporais, rítimicos, mais referenciados com o sistema auditivo.

A criança localiza a si própria antes de se localizar no espaço ou de localizar objetos no espaço. Localiza os objetos em relação a si própria e posteriormente, localiza cada objeto sem precisar referi-los corporalmente.

A criança contrói a noção do espaço através da interpretação de uma constelação de dados sensoriais que não têm relação direta com o espaço. Daí os inúmeros problemas que muitas crianças com dificuldade de aprendizagem experimentam em tarefas espaciais.

A criança tem de aprender a interpretar as informações sensoriais em termos de espaço e construir os conceitos espaciais em termos sensoriais ne motores. A criança só pode desenvolver um mundo espacial estável depois de aprender a interpretar as informações vestibulares, proprioceptivas e exteroceptivas em termos de espaço, isto é, em termos de localização corporal interiorizada.

Organização

A organização espacial compreende a capacidade espacial concreta de calcular as distâncias e os ajustamentos dos planos motores necessários para os percorrer, pondo em jogo as funções de análise espacial, processamento e julgamento da distância e da direção, planificação motora e verbalização simbólica da experiência.

Estruturação dinâmica

A estruturação dinâmica compreende a capacidade de memorização sequencial visual de estruturas espaciais simples.

Trata-se de uma tarefa que aprecia a capacidade da criança reproduzir de memória sequencias de fósforos em posições e orientações espaciais determinadas.

Representação topográfica

A representação topográfica retrata a capacidade espacial semiótica e a capacidade de interiorização de uma trajetória espacial apresentada num levantamento topográfico das coordenadas espaciais e objetais da sala.

Dada a dificuldade das aptidões espaciais que a tarefa requer, ela não é normalmente realizada em crianças em idade pré-primária.

Estruturação Rítmica

A estruturação rítmica compreende a capacidade de memorização e reprodução motora de estruturas rítmicas.

Trata-se de uma tarefa que avalia problemas de percepção auditiva e de memorização de curto termo e a translação dos estímulos auditivos para as respostas motoras. A criança deve captar, reter, rechamar e expressar em termos motores.

Praxia Global

Envolve a organização da atividade consciente e a sua programação, regulação e verificação. Essa unidade funcional está localizada nas regiões anteriores do córtex, mais exatamente nos lóbulos frontais.

A praxia global, por compreender tarefas motoras sequenciais globais, está mais relacionada com a área 6, que, segundo Luria, tem como principal missão a realização e a automação dos movimentos globais complesxos que se desenrolam num certo período de tempo e que exigem a atividade conjunta de vários grupos musculares.

A praxia global para ser desencadeada vai exigir a integração e a interação da primeira e da segunda unidade funcional do modelo luriano. Para esse efeito vai rechamar a tonicidade e a equilibração, pondo em jogo a combinação minuciosa do tônus da profundidade com o da superfície, eliminando a presença de quaisquer sinergias onerosas e a sincronização de sistemas extrapiramidais, cerebelosos e vestibulares, que asseguram a estabilidade gravitacional necessária. Reclama, por outro lado, a coordenação da lateralização, da noção do corpo e da estruturação espácio-temporal para harmonizar o espaço intracorporal com o extracorporal e, por ultimo a função decisão, regulação e verificação para materializar a intenção e atingir o fim, que esteve exatamente na sua origem.

Coordenação oculomanual

A coordenação oculomanual compreende a capacidade de coordenar movimentos manuais com referênciaas perceptivo-visuais.

Coordenação oculopedal

A coordenação oculopedal compreende a capacidade de coordenar movimentos pedais com referências perceptivo-visuais.

Dismetria

A dismetria que caracteriza a realização dispráxica traduz a inadaptação visuoespacial e visuoquinestésica dos movimentos orientados face a uma distância ou a um objeto.

No caso da BPM, esse subfator não constitui uma tarefa em si, pois resulta da observação das duas tarefas anteriores.

Disssociação

A dissociação compreende a capacidade de individualizar vários segmentos corporais que tomam parte na planificação e execução motora de um gesto ou de vários gestos intencionais sequencializados.

Significação psiconeurológica

A análise das praxias implica o estudo das formas complexas de contrução de movimentos voluntários, como os que estão contidos nos subfatores da BPM.

A apreciação do fator da praxia global permite observar o grau de integração cortical dos restantes fatores: da tonicidade, da equilibração, da lateralização, da noção do corpo e da estruturação espácio-temporal.

Praxia Fina

A praxia fina, por compreender as tarefas motoras sequenciais finas, está mais relacionada com a área 8, que, de acordo com o modelo de Luria, está adstrita à função de coordenação dos movimentos dos olhos durante a fixação da atenção e durante as manipulações de objetos que exigem controle visual além de abrengerem as funções de programação, regulação e verificação das atividades preensivas e manipulativas mais finas e complexas.

A mão, considerada a unidade motora mais complexa do mundo animal é em grande mediada a arquiteta da civilização e naturalmente a arquiteta da inteligência na criança e no homem.

* A mão que traduz o enfoque central da praxia fina.

A mão como órgão de apropriação e relação com o exterior vai ser um dispositivo fundamental par ao desenvolvimento psicológico da criança. No ser humano, quer filogenética, quer ontogeneticamente, a mão assume a função de construção, de transformação e de fabricação surgindo como o instrumento corporal privilegiado e materializado da evolução cerebral.

Coordenação dinâmica manual

A coordenação dinâmica manual compreende a destralidade bimanual e a agilidade digital, visando o estudo da coordenação fina das mãos e dos dedos

Tamborilar

O tamborilar comprende uma tarefa da motricidade fina que estuda a dissociação digital sequencial que envolve a localização tátil-quinestésica dos dedos e a sua motricidade independente e harmoniosa.

Velocidade- precisão

Compreende duas tarefas de coordenação práxica do lápis, que envolve a preferência manual e a coordenação visuográfica.

A tarefa exige a integração significativa de movimentos finos de um instrumento com as aquisições perceptivo-visuais da coordenação visuomotora, figura e fundo e posição-relação espacial.

Significação psiconeurológica

Está intimamente relacionada com as funções da terceira unidade funcional do modelo de Luria.

A terceira unidade funcional é responsável pela programação e regulação da atividade. Nela se distinguem as zonas motoras pré motoras, designadas por Luria como zonas ou áreas secundárias frontais portadoras de conexões muito complexas com a primeira e segunda unidades. É este caráter de integração e de estreita interação da terceira unidade que a torna um centro organizador e programador dos movimentos complexos, como os que estão contidos no fator da praxia fina BPM.